Estou há um tempo querendo postar estas imagens, desde que recebi meu exemplar de autora. Quando fui apresentada à corrente de pensamento conhecida como Consumer Culture Theory (CCT) em 2007, no meu primeiro semestre de doutorado, jamais poderia imaginar que, um dia, eu também escreveria um capítulo dessa história.
A série de livros Research in Consumer Behavior: Consumer Culture Theory reúne, a cada edição, os melhores artigos apresentados no congresso anual da CCT. Neste volume em particular, que resultou do congresso de 2018 em Odense, todos os capítulos oferecem contos de consumo. São pesquisas científicas que empregam o storytelling, inspiradas pela cidade onde nasceu Hans Christian Andersen e que foi sede do evento.
Meu capítulo conta uma história de vida e de morte, com produtos eróticos personificados enquanto mordomos, amantes, amigos ou indesejáveis penetras. Minhas entrevistadas tratam seus vibradores como entes vivos e lhes dão nomes como Anthony, Paulinho, Johnnie, James e Barbie. Quando eles param de funcionar, as consumidoras passam por um processo ritualístico de descarte que muitas vezes lembra um enterro. Elas dizem que o vibrador morreu, o colocam em sacos pretos e saem de casa para descartá-lo em lixeiras públicas, por medo de serem identificadas.
Julia (nome fictício) juntou cinco vibradores quebrados até ter a coragem de jogá-los fora na lixeira de um parque: “Eu embrulhei todos num jornal e a gente [ela e marido] jogou isso num lixo público. Longe de casa (risos)! Primeiro porque eu já tava péssima, era tipo um amigo, meu vibrador (risos). Aí eu já fiquei com vergonha, imagina…!”. Ao falar da armazenagem dos produtos eróticos em casa, ela conta, ainda, que três vibradores feitos do mesmo material ficam “dormindo juntinhos”.
Tratar tais produtos como vivos, mortos ou adormecidos é uma forma de prosopopéia que mostra não apenas a intensidade do relacionamento entre consumidora e produtos eróticos, mas evidencia também que eles possuem agência. Em um relacionamento mutuamente constitutivo, consumidora transforma produto ao manipular sua materialidade, ao alterar seus significados, ao criar novos usos e propósitos que podem ser entendidos pela indústria como demandas não atendidas; enquanto isso, produto transforma consumidora ao fazer dela uma nova mulher, indelevelmente marcada pelo consumo erótico, autora e protagonista do próprio prazer. Quando o produto é usado conjugalmente, efeito equivalente pode ocorrer sobre a relação do casal e sobre o homem.